Através das pinturas figurativas e colagens, Emília Caetano Fernandes, Teresa Raffray e Nelly Guambe materializam as suas reflexões sobre a mulher e o seu lugar no mundo. Que é um dos caminhos mais efectivos para tal exercício e é disso prova que o regime samoriano à arte recorreu para divulgar a mensagem de construção do Homem Novo por via, por exemplo, do Xiconhoca.
Para acomodar os trabalhos destas artistas, respeitando o traço e as perspectivas individuais, Nelsa Guambe opta por as dispor em série, em sentido antológico. E desse modo nos permite aceder a janela possível para ver este espectáculo da vida.
Guy Debord observa que quanto mais se contempla o externo, menos se chega a si próprio. Talvez por tal razão, em sentido contrário, Emília Caetano Fernandes, numa das suas obras, opta pelo auto-retrato. Mas de modo geral, toma fotografias aleatórias e de pessoas conhecidas para trazer à luz a personalidade do retratado. Nalguns casos assume que é mera ficção. E nisto temos uma espécie de update do método de outrora de um modelo que deveria pousar até ao fim da obra. O romance “O retrato de Dorian Gray”, de Oscar Wilde, mostra que não era algo de todo easy. Entretanto a essência permanece, se considerarmos verdadeiro o choque de Griet, no filme “Girl with a Pearl Earring”, ao ver o seu retrato pintado por Johannes Vermeer, que foi: captaste o meu eu.
Teresa Raffray, com outro repertório, parece ter a intenção formativa, tomando de empréstimo a expressão de Umberto Eco, de retratar as rotinas e performances do ser mulher Moçambicana. O seu tacto, a sua função institucionalizada nos nossos padrões. Cruzando a pintura em aguarela e recortes de fotografias, na sua técnica de colagem, estão presentes insinuações, semblantes, máscaras, mãos, silhuetas. E também estabelece diálogos ou questionamentos sobre a arte ao misturar o tradicional (pintura) com a contemporânea (fotografia abundante nas redes sociais e na galeria dos nossos smartphones).
Mais minimalista que o habitual, Nelly Guambe através de um ritmo cromático sugestivo aponta para uma introspecção sobre o ser e estar enquanto mulher. A sua “batota” do olhar que choca e prende pela carga nostálgica domina as suas telas. E as flores com as quais convive diariamente neste momento em Chicuque, vilarejo da Maxixe, tatuam o momento que vive, confirmando a determinação do cronotopo bakhtiniano na criação artística.
Leonel Matusse Jr.